Recursos foram todos utilizados para cobrir despesas com previdência estadual. Anteriormente movimentado apenas por recursos de decisões da Justiça, o fundo foi alterado para permitir saques do Executivo em 2015
Em pouco mais de dois meses, o governo do Ceará já gastou mais de R$ 156 milhões oriundos do fundo de depósitos judiciais para cobrir despesas da previdência estadual. O uso do fundo, que tem saldo de R$ 1,2 bilhão, ainda é alvo de queda de braço entre poderes Executivo e Judiciário.
Originalmente movimentado apenas por recursos de decisões da Justiça envolvendo o Estado – seja em receitas ou dívidas –, o fundo foi alterado em 30 de outubro passado. A mudança permite que o governo use até 70% da verba, ficando o restante de reserva para pagamento de partes vencedoras de processos.
Segundo dados da Secretaria da Fazenda (Sefaz), o Executivo estadual retirou R$ 107 milhões do fundo entre novembro e dezembro de 2015. Em janeiro deste ano, mais de R$ 48 milhões saíram da reserva.
Em todo o País, Estados que recorreram ao fundo do Judiciário já gastaram R$ 17 bilhões, de acordo com o Conselho Nacional de Justiça (CNJ). O governo do Ceará destaca, no entanto, que utiliza a verba apenas para aportes na previdência, diferentemente do que ocorre em outras gestões.
“Queda de braço”
Lei aprovada pela Assembleia Legislativa autorizando saques do fundo é criticada por membros do Judiciário. Conforme a Associação Cearense de Magistrados (ACM) e a Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB), a medida é inconstitucional porque fere a independência dos poderes.
Antes da mudança, o fundo de decisões judiciárias era gerido pelo Tribunal de Justiça do Ceará (TJCE), que utilizava 30% da verba em investimentos da Corte. Já os 70% restantes ficavam no caixa para pagamentos.
A alteração, que possibilita o uso do recurso pelo Estado, causou polêmica desde sua votação. No dia em que o assunto foi ao plenário da AL, associações de categorias do Judiciário distribuíram ofícios pedindo rejeição da matéria.
Líder do governo na Assembleia, Evandro Leitão (PDT) defendeu a proposta, afirmando que “todo o dinheiro que for utilizado terá um código identificando a fonte de onde foi utilizado”.
Na época da aprovação, a Ordem dos Advogados do Brasil no Ceará (OAB-CE) também atuou contra a medida. Já em novembro, a gestão Valdetário Monteiro encaminhou pedido de Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) contra o projeto ao Conselho Federal da OAB.
Procurados pelo O POVO, nem o governo do Estado nem o TJCE quiseram comentar a polêmica, que é alvo de ações na Justiça. “A questão está judicializada, e o TJ não vai se pronunciar sobre o assunto”, informou a assessoria da presidência do órgão.