STF suspende julgamento sobre vasectomias e laqueaduras voluntárias logo após o início; não há data para retomar

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O STF (Supremo Tribunal Federal) iniciou, nesta quarta-feira (17/4), o julgamento de uma ação que discute as condições para que homens e mulheres possam fazer cirurgias de vasectomias e laqueaduras voluntárias no país.

Os ministros ainda não vão julgar o mérito do caso nesta primeira fase da análise, mas as partes envolvidas apresentaram suas argumentações nas chamadas sustentações orais.

Depois, o presidente da corte, Luís Roberto Barroso, suspendeu o julgamento, que deve ser retomado com os votos dos ministros nos próximos meses. Kassio Nunes Marques é o relator da ação.

A ação foi movida pelo PSB (Partido Socialista Brasileiro) contra trechos da Lei do Planejamento Familiar que tratam de condições como idade superior a 25 anos ou dois filhos vivos e autorização expressa de ambos os cônjuges para a realização de esterilização voluntária.

Uma nova lei em vigor desde março de 2023, porém, mudou a regra para 21 anos ou que tenham dois filhos vivos podem solicitar o ato cirúrgico, desde que respeitado um prazo mínimo de 60 dias entre o pedido e a cirurgia.

Uma terceira alteração é sobre a realização da cirurgia em casos de parto. No texto original, a esterilização não poderia ser feita durante o parto ou aborto. Agora, a nova lei abre a possibilidade de o procedimento ocorrer no decorrer do nascimento de um bebê.

Na ocasião, a lei foi considerada um avanço aos direitos das mulheres. O PSB, no entanto, pede a retirada da obrigatoriedade de descendentes e a redução da idade mínima para 18 anos.

O partido argumentou que as exigências afrontam os direitos fundamentais das pessoas, contrariam tratados internacionais firmados pelo Brasil e divergem dos principais ordenamentos jurídicos estrangeiros.

Além disso, afirmou que há flagrantes violações a princípios constitucionais como a da dignidade da pessoa humana, a liberdade de escolha, de planejamento familiar e dos direitos reprodutivos e sexuais.

O partido também alegou que as limitações à esterilização voluntária prejudicam mais diretamente as camadas sociais vulneráveis da sociedade, que apresentam maior taxa de fecundidade e dificilmente podem se valer da medicina particular.

A Associação do Movimento Brasil Laico, que pediu para participar do caso, alegou que a decisão de esterilizar-se cabe à pessoa interessada, vedado ao Estado nela intervir.

A Constituição Federal diz que o planejamento familiar é livre decisão do casal, competindo ao Estado propiciar recursos educacionais e científicos para o exercício desse direito, vedada qualquer forma coercitiva por parte de instituições oficiais ou privadas.

Também foi anexada na ação uma pesquisa realizada em seis capitais brasileiras (Palmas, Recife, Cuiabá, Belo Horizonte, São Paulo e Curitiba) com homens e mulheres que buscavam a esterilização cirúrgica no SUS (Sistema Único de Saúde).

O estudo verificou que após um período de cerca de 6 meses, apenas 25,8% das mulheres e 31% dos homens que demandaram a cirurgia haviam obtido sucesso. O partido destaca ainda o fato de que 8% das mulheres engravidaram durante o período de espera pela esterilização.

Após a mudança da lei, o número de laqueaduras feitas pelo SUS saltou de 22.392, em 2022, para 39.276, em 2023 —um aumento de 75,4%, segundo dados da SES (Secretaria de Estado de Saúde) de São Paulo.

A inserção de DIU também cresceu, passando de 41.118 para 43.255 procedimentos no mesmo período (alta de 5,2%).

Apenas nos dois primeiros meses do ano, já foram feitas outras 7.137 laqueaduras e 6.256 inserções de DIU —o equivalente a 18,17% e 14,46%, respectivamente, dos procedimentos realizados em 2023.

No município de São Paulo, segundo a SMS (Secretaria Municipal de Saúde), até março deste ano foram feitas 418 inserções de DIUs e 2.353 procedimentos de laqueadura tubária.

Ao se manifestarem no Supremo, as partes e os representantes de entidades interessadas no tema se declararam contra as restrições da lei.

O defensor público de São Paulo Rafael Munaretti disse que “no que tange aos direitos reprodutivos, principalmente das mulheres, há sempre uma opção tuteladora e controladora do Estado, e, nesse caso, baseada, em critérios duvidosos”.

“Por que 21 anos? Por que não 25, como era antes e mudou? Por que não 19? Por que não três filhos ou um filho? Para se evitar essa verdadeira casuística restritiva, nada mais justo e correto do que se adotar apenas o conceito de capacidade civil plena”, disse Muneratti.

A capacidade civil plena se dá quando uma pessoa atinge os 18 anos ou em alguma situação de emancipação.

Representando o Sindicato dos Médicos do Estado do Paraná, Luiz Gustavo de Andrade afirmou que a norma restritiva impede o livre planejamento familiar.

A advogada do PSB, Ana Letícia Bezerra, também frisou que a legislação é restritiva e arbitrária, e interfere na esfera privada de mulheres./Folha SP

(Foto reprodução)

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