Psicofobia: O preconceito com transtornos mentais que afasta pessoas do convívio social

6 Min. de Leitura

A jornalista Shaonny Takaiama participou de um processo seletivo em uma empresa no final de 2017. Ela já havia passado pelas etapas principais, como provas classificatórias e entrevista com gestores. Após a análise do currículo e das competências de Takaiama, ela foi aprovada para a vaga. Porém, nunca chegou a exercer o posto. O motivo? Ao revelar no exame admissional que era diagnosticada com transtorno bipolar e borderline, a jornalista diz que acabou sendo desclassificada da seleção.

Em seu relato, ela compartilha que foi acompanhada por médicos psiquiatras e psicólogos durante todo o processo. Os profissionais atestaram a estabilidade mental e a capacidade da profissional de ocupar a vaga. Porém, os relatórios médicos não foram suficientes para convencer a empresa.

“O diretor do recursos humanos me disse que eu havia faltado com honestidade durante o processo seletivo e que por isso estava sendo afastada do cargo”, explica Takaiama em entrevista. “Para a empresa, eu já deveria ter dito, durante a entrevista de emprego, que eu sou bipolar e borderline, mesmo sem ter sido questionada sobre isso. O que me faz pensar: ‘se eu tivesse falado sobre o meu diagnóstico, então eles já poderiam ter me excluído do processo seletivo logo de cara’. Seja no processo seletivo ou no processo de contratação, eu seria descartada por ter estas duas doenças.”

Não é a primeira vez que Takaiama vivencia uma situação de preconceito ao falar abertamente sobre o seu diagnóstico.

“A gente escuta desde a famosa frase ‘depressão é frescura’ a outras como ‘acho que sou bipolar, porque hoje estou super bem, mas ontem estava super mal’. Também ouço muito que ‘tudo isso é coisa da minha cabeça’, o que não deixa de ser verdade, né, afinal, todos os transtornos mentais são mesmo coisa da nossa cabeça”, compartilha a jornalista.

Ela argumenta que o desconhecimento dos empregadores sobre o que são os transtornos mentais acaba por levantar suspeitas da capacidade e da estabilidade dos pacientes.

O que é o Transtorno de Humor Bipolar

“É uma doença como outra qualquer. Precisa de diagnóstico e de tratamento”, explica Antonio Silva, presidente da Associação Brasileira de Psiquiatria. O distúrbio bipolar é caracterizado por episódios de depressão e euforia (obsessão). A causa exata do distúrbio não é conhecida e a orientação é buscar um médico psiquiatra. Só no Brasil, o transtorno de humor bipolar afeta mais de dois milhões de pessoas por ano.

O que é a Síndrome de Borderline

Também chamada de transtorno de personalidade limítrofe, é caracterizada pelas mudanças de humor e comportamentos compulsivos e impulsivos. O caso difere do transtorno de humor bipolar sobretudo pela duração das crises. A orientação é buscar um médico psiquiatra.

Mas o que é a psicofobia?

O caso de Shaonny Takaiama não é isolado. De acordo com dados da Organização Mundial de Saúde (OMS), o Brasil tem os mais altos índices de depressão e transtornos de ansiedade da América Latina, por exemplo. O termo psicofobia, então, foi criado para evitar que essa população seja afastada do convívio social.

O conceito faz parte de uma campanha da ABP para chamar atenção sobre o preconceito sofrido por quem foi diagnosticado com transtorno mental. Durante a campanha, também foi criado o projeto de lei do Senado 74/2014 que criminaliza a psicofobia.

“A palavra psicofobia é fruto de um contexto em que as pessoas são diagnosticadas e têm vergonha de se tratar. Foi preciso classificar o preconceito que essas pessoas sofrem, na mesma linha da homofobia e xenofobia. A ideia de criminalizar é ser uma ação educativa e de conscientização; não tem como objetivo colocar ninguém na cadeia. As pessoas precisam cuidar e respeitar as pessoas portadoras de transtornos mentais”, argumenta Antonio Silva, presidente da ABP, em entrevista ao HuffPost Brasil.

Silva chama atenção para a falta de políticas públicas que protejam essas pessoas ou, ainda, que possibilitem um atendimento médico ampliado para melhor diagnóstico e acompanhamento dos casos.

“Hoje em dia, não há nenhuma orientação caso você deixe de contratar alguém por um quadro psiquiátrico”, explica Silva.

Para Shaonny Takaiama, uma ação judicial contra a instituição seria uma estratégia para chamar atenção do que é a psicofobia na sociedade. Mais do que a via criminal, Takaiama defende que os pacientes falem abertamente sobre os seus transtornos.

“Quero que isso abra um precedente para que outras pessoas que também sofrem do mesmo problema que eu sofri criem coragem e comecem a buscar justiça. Para que a cultura das empresas comece a mudar no que tange aos transtornos mentais, é necessário que as pessoas não tenham medo de se expor nem de lutar contra o preconceito”,conclui./ HuffPost Brasil

 

Compartilhar Notícia