Nesta terça-feira (30/5), em uma decisão inédita, o Tribunal Regional Eleitoral do Ceará (TRE-CE), cassou a chapa do PL Ceará, afetando o mandato de quatro deputados estaduais eleitos, por fraude à cota de gênero nas eleições de 2022, também pelo placar de 4 votos a 3.
Foram cassados os deputados estaduais Alcides Fernandes, Dra. Silvana, Marta Gonçalves e Carmelo Neto, este último foi o mais votado na disputa pelo cargo no ano passado.
Os dois casos se cruzam na linha do tempo, por tratarem do mesmo tema, fraude à cota de gênero, ou seja, são candidaturas lançadas apenas para atender a legislação eleitoral e não com a finalidade de ampliação da participação feminina na política brasileira, por isso são consideradas, candidaturas fictícias.
No julgamento do TSE, sobre fraude a cota de gênero, no caso específico de Itaiçaba-CE, que cassou todos os candidatos do Cidadania daquele município, teve uma particularidade, o embate de ideias sobre o tema expostos pelo ministros Nunes Marques e Carmem Lúcia.
É justamente esse o cenário que os deputados do PL do Ceará irão encontrar na Corte, uma vez que já anunciaram que irão recorrer da decisão do TRE-CE para o TSE.
No julgamento da Ação de Investigação Judicial Eleitoral (AIJE) de Itaiçaba, segundo os autos, as candidaturas de Michelly Gomes e Emmanuelle Maria foram formalizadas de maneira fictícia, apenas com o intuito de cumprir o artigo 10 da Lei das Eleições (Lei 9.504/1997) que determina o preenchimento mínimo de 30% e máximo de 70% para candidaturas de cada sexo.
Nos debates sobre este caso específico de Itaiçaba ficou evidente os posicionamentos do Tribunal Superior Eleitoral que formou maioria para cassação da chapa do Cidadania por candidaturas fictícias, chamando atenção em especial o debate entre Nunes Marques e Cármem Lúcia.
Para Nunes Marques, seria necessário ter “empatia” com as mulheres que se candidatam e que nunca participaram de campanha eleitoral e não sabem como percorrer esse caminho durante o pleito sem o apoio do partido.
Já a ministra Cármen Lúcia discordou e reforçou que é preciso uma educação que reconheça a mulher como uma pessoa dotada de autonomia e capaz, sem precisar ser amparada, e que essa é a educação que a Justiça Eleitoral tem tradição de oferecer.
“O que a gente quer, nós, mulheres, não é empatia da Justiça, é respeito aos nossos direitos. É preciso que tenha educação cívica para todos os brasileiros igualmente participarem livremente, autonomamente, com galhardia, das campanhas eleitorais e da vida política de um país”, defendeu a ministra.
Cármem Lúcia destacou ainda que se a legenda abandonar a campanha da mulher lançada como candidata, ela deve ir até o partido e dizer que, nessas condições, não vai participar, sob pena de ser conivente com a fraude.
“Nós queremos educar as mulheres, oferecer condições de educação para que elas façam isso. Então, eu não acho que aqui é uma questão de empatia, é de constitucionalidade. Não é constitucional termos um dispositivo que estabelece a igualdade entre homens e mulheres e que não é cumprido. A desigualdade é o maior problema que nós temos no Brasil, incluída [a desigualdade] contra as mulheres” disse Cámem Lúcia.
Em seguida, a ministra ponderou ainda que “não é com empatia que vamos transformar essa realidade na qual mulheres e homens deveriam ser [mas não são], iguais em direito nos termos da Constituição”. A ministra enfatizou que a regra da cota de gênero existe desde 1996 e que os partidos políticos não obedecem se não for por força de decisão judicial.
Os posicionamentos de Nunes Marques e Cármem Lúcia dão uma prévia do cenário que os deputados estaduais irão encontrar no TSE sobre o tema. De um lado, cobra-se mais “empatia” com as mulheres que participam do pleito, do outro, defende-se constitucionalidade no cumprimento da lei por conta dos partidos e das pessoas que fazem política e insistem em descumprir a lei.