O veículo em que estava o ex-atleta se chocou com um ônibus na madrugada de segunda-feira (11), em Cali, no bairro de San Fernando. De acordo com as autoridades locais, o carro desrespeitou um sinal vermelho em alta velocidade e foi atingido lateralmente. Havia duas mulheres com Rincón, que tiveram ferimentos leves. O motorista do ônibus teve fratura na perna.
Internado na Clínica Imbanaco com traumatismo cranioencefálico, o ex-volante passou por uma cirurgia de quase três horas. Os primeiros boletins médicos apontaram que ele estava em “estado muito crítico” e “com medidas avançadas de suporte”. Na noite de quarta, já madrugada de quinta no Brasil, a clínica anunciou a morte.
Rincón recebeu homenagens de diversos clubes por que passou. Ele iniciou a carreira em equipes da Colômbia, destacando-se no Independiente Santa Fe e no América de Cali, na virada da década de 1980 para a de 1990. Chegou ao Palmeiras em 1994, em sua primeira parada no Brasil, país em que viveria seus melhores momentos.
Após uma estadia relativamente discreta na Europa, defendendo o italiano Napoli e o espanhol Real Madrid –onde dizia ter sofrido racismo–, ele retornou ao Palmeiras em 1996. Em 1997, trocou de camisa e passou a vestir a do arquirrival Corinthians, aquela com a qual construiu a maior identificação e levantou seus mais importantes troféus.
Em preto e branco, Rincón, que fora atacante e meia, transformou-se em excepcional volante, inicialmente por decisão do técnico Joel Santana. Em 1998, quando conquistou o Campeonato Brasileiro pela primeira vez, passou a formar com Vampeta, Ricardinho e Marcelinho um meio-campo histórico alvinegro.
Campeão paulista em 1999 –título que já havia obtido duas vezes no Palmeiras–, o colombiano herdou a faixa de capitão do zagueiro paraguaio Gamarra, que deixou o time após o triunfo estadual. Foi com a tarja no braço que ergueu a taça do Brasileiro de 1999 e viveu a cena que marcou sua carreira, no Mundial de Clubes de 2000.
“Nada supera a hora em que levantei a taça de campeão do mundo. Foi inesquecível. No instante em que você pega o troféu, vem um sentimento de alívio. Você pensa assim: ‘Ufa, foi sofrido, mas o dever está cumprido'”, disse, em 2011, em entrevista à Gazeta Esportiva, recordando o jeito quase agressivo de que recebeu o objeto prateado das mãos do presidente da Fifa, Joseph Blatter.
“Sacudindo o troféu, né? Extravasei mesmo. Até porque eu estava saindo do Corinthians naquela época. Na minha cabeça, estava dizendo: ‘Puxa, fechei a minha passagem com chave de ouro’. Foi uma coisa extremamente forte na minha carreira”, acrescentou, saudoso da festa feita no Rio de Janeiro naquele 14 de janeiro.
Em um Maracanã no qual os corintianos faziam muito mais barulho do que os torcedores do Vasco e gritavam ininterruptamente “todo-poderoso Timão”, a formação do Parque São Jorge triunfou nos pênaltis, após empate sem gols. Rincón deixou o time em seguida, indo jogar no Santos e sendo chamado de mercenário –a mágoa se dissipou com o tempo.
A queda no desempenho, natural, foi notória nos últimos anos da carreira, com passagem também pelo Cruzeiro. Em 2004, o colombiano ainda retornou ao Corinthians, longe da velha forma, e participou de uma campanha muito fraca no Campeonato Paulista, com risco de rebaixamento até a última rodada.
Pela seleção da Colômbia, Freddy disputou três edições da Copa do Mundo, 1990, 1994 e 1998. Foi parte de uma geração marcante do país, que teve também nomes como René Higuita, Carlos Valderrama e Faustino Asprilla. No Mundial de 1990, na Itália, marcou um gol histórico contra a Alemanha Ocidental –que seria campeã dias depois–, definindo a classificação às oitavas de final.
Foi uma vaga muito celebrada pelos colombianos, que nem sequer iam à Copa desde 1962. Já o caminho para o Mundial de 1994 teve uma goleada por 5 a 0 sobre a Argentina, com dois gols de Rincón. A campanha nas Eliminatórias fez Pelé apontar a Colômbia como favorita ao título, mas o time não passou da primeira fase.
Como atacante e meio-campista, Freddy disputou 84 partidas por sua seleção, marcando 17 gols. No Corinthians, clube brasileiro em que teve maior longevidade, esteve em campo 158 vezes, colocando 11 bolas na rede. Uma delas, contra o saudita Al Nassr, pôs a equipe alvinegra na final do Mundial de 2000.
Aposentado, ele teve passagens como auxiliar técnico, trabalhando com Vanderlei Luxemburgo no Atlético Mineiro, e chegou a assumir os times sub-20 e sub-23 do Corinthians. Como ocorrera em 2000, deixou o clube reclamando da corrupção dos dirigentes. Voltou à Colômbia, onde também atuou como auxiliar, sem ver sua carreira à beira do campo deslanchar.
Rincón chegou a ter problemas na Justiça e foi preso em 2007, acusado de lavagem de dinheiro e tráfico de drogas no Panamá. Ele foi detido em São Paulo, em uma operação internacional, a pedido do Panamá, com participação da Interpol e da Polícia Federal brasileira. Solto com um habeas corpus do STF (Supremo Tribunal Federal) após quatro meses, acabou absolvido no processo.
“Não tenho dúvida de que alguém quis aparecer às minhas custas. O que fica disso tudo é a minha honestidade. A minha conduta de vida não vai mudar por nada”, disse o colombiano, que sempre fora muito respeitado em seu tempo de jogador. Ele aliava a qualidade técnica a uma força física intimidante. Para adversários e companheiros.
No excelente e desunido Corinthians do fim dos anos 1990, o camisa 8 chegou a atirar Marcelinho em um armário, acusando-o de forçar expulsão. Eram muito recorrentes as brigas com Edílson, com quem passou meses sem se falar. Mas, em um vestiário no qual Edílson chegou a perseguir Marcelinho com uma faca, Rincón era a força mais respeitada.
“É complicado lidar com egos, sabe? Muitos jogadores tinham estrelismo naquele elenco. Eu só me preocupava em dar o exemplo, trabalhando e fazendo as coisas certas, para ter moral de cobrar depois. Desse jeito, conseguia ser respeitado”, afirmou à Gazeta Esportiva. “Não existia união nenhuma. O importante é que, quando subíamos ao gramado, o objetivo era um só.”
Foi com um objetivo só que os desgastados jogadores alvinegros entraram em campo na decisão do Mundial, dias após a conquista do Campeonato Brasileiro. Foram 120 minutos de luta, que deixaram Rincón com uma lesão muscular. Ainda assim, com personalidade, ele abriu a disputa de pênaltis em chute preciso.
Ao fim dela, estava para sempre na história do Corinthians./Folha SP
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