Ao conceder liberdade ao empresário/compadre Jacob Barata Filho, pela segunda vez, o ministro Gilmar Mendes atropelou os princípios jurídicos da Confiança, do Contraditório Substancial e da Segurança Jurídica, os principais alicerces do sistema de garantias do Direito Processual e Constitucional, porque os magistrados são impedidos de prolatar decisões de surpresa, sem que sua manifestação tenha sido provocada por existência de petição ou recurso específico. Ao agir desta forma autoritária e parcial, descumprindo a lei, Gilmar Mendes confirmou as evidências de que deveria ter-se declarado suspeito para participar do julgamento de um réu com o qual mantém ligações de amizade.
O princípio constitucional do contraditório proíbe o juiz de tomar decisões-surpresa, por sua própria vontade, sem que tenha sido provocado a se manifestar por alguma das partes. No caso de Barata, o relator do Supremo só poderia libertá-lo após ter sido impetrado novo recurso pela defesa do empresário envolvido em gravíssimos atos de corrupção.
DIZ A LEI – Ao libertar Barata pela segunda vez, Gilmar Mendes desrespeitou claramente o artigo 10 do Novo Código de Processo Civil, que proíbe a decisão-surpresa: “O juiz não pode decidir, em grau algum de jurisdição, com base em fundamento a respeito do qual não se tenha dado às partes oportunidade de se manifestar, ainda que se trate de matéria sobre a qual deva decidir de ofício”.
Pois o ministro-relator do Supremo fez exatamente o contrário. Adotou a ilegal decisão-surpresa e mandou libertar o réu/compadre, sem tomar conhecimento dos fundamentos da nova ordem de prisão adotada pelo juiz em primeira instância. Por isso, trata-se de um ato jurídico inválido, sem base em lei, princípio ou doutrina, foi uma mera manifestação de vontade e autoritarismo funcional.
JUIZ OU ADVOGADO? – Nenhum juiz tem direito de agir como se fosse advogado do réu, manifestando-se a favor dele antes mesmo de ser apresentado o necessário recurso. Mas foi exatamente isso que Gilmar Mendes fez, porque a advogada Daniela Rodrigues Teixeira, responsável pela defesa de Barata Filho, não havia se pronunciado nos autos.
Procurada pelo reportagem do Estadão, ela afirmou que não podia comentar uma decisão que, “juridicamente, ainda não existe”. E acrescentou: “Eu só fiquei sabendo por meio da imprensa. Oficialmente, não há nenhum registro dela. Então, ainda não posso me manifestar”, disse Daniela Rodrigues Teixeira.
Mesmo assim, o ministro/compadre não teve dúvida de emitir uma decisão-surpresa em favor do amigo, afrontando alguns dos mais importantes fundamentos do Direito. Baseou-a no parágrafo 2º do art. 654 do Código de Processo Penal: “Os juízes e os tribunais têm competência para expedir de ofício ordem de habeas corpus, quando no curso de processo verificarem que alguém sofre ou está na iminência de sofrer coação ilegal“. Ora, coação ilegal de um dos maiores corruptores da História do Brasil…
JUIZ TINHA RAZÃO – E o pior de todo esse imbróglio é que o juiz Marcelo Bretas agiu acertadamente ao expedir as novas ordens de prisão. Na semana passada ele já havia reiterado a prisão de Lelis Teixeira em função de “fatos novos”, porque o Ministério Público Federal passou a acusar Teixeira e Barata de implantarem esquema de corrupção também no sistema de transporte municipal.
Quanto ao empresário Barata, havia a ordem de prisão por evasão de divisas. Por esse crime, ele fora pego em flagrante e teve prisão preventiva decretada. Como ambos já estavam presos, o juiz Bretas não achou necessário expedir novos mandados de prisão, mas se viu obrigado a decretá-los, em função do habeas corpus equivocadamente concedido por Gilmar Mendes, em fase liminar, sem ouvir a Segunda Turma do Supremo.
(NBO)