A tragédia da escola de Suzano vai além da discussão do porte e posse de armas no País. Por Reginaldo Silva

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Flávio Gikovate faleceu em 2016. Médico, psiquiatra, psicoterapeuta, conferencista e escritor. Ele escreveu mais de trinta livros. Flávio dizia que escrevia  o que via na prática. Seu material de trabalho era a observação do comportamento humano. “Não invento fórmulas,” dizia ele.

Em uma de suas palestras, Flávio demonstrava sua preocupação com as novas gerações tecnológicas. Para ele, em um tempo não muito distante, as maiores referência dos filhos se limitavam à rua de suas casas, onde eram ladeados de vizinhos da própria família, geralmente um tio, uma tia, os avós. As brincadeiras podiam ser acompanhadas das janelas e a qualquer sinal de transgressão vinham as reprimendas. Portanto, a formação de crenças e costumes estavam intrinsecamente ligados a própria família.

Com o advento tecnológico vieram os “games”, jogos e batalhas de seres desconhecidos que soltam fogo por todos os lados, criaturas inimagináveis que muitas vezes aparecem nas telas com requinte de violência e crueldade. Flávio tinha a preocupação com a formação dos nossos jovens, sobre a formação de suas crenças e costumes. Que tipo de seres humanos estariam em formação?

Com isto, não quero dizer que a tragédia da Escola Raul Brasil em Suzano, seja uma consequência apenas de jogos utilizados por aqueles jovens. Muito menos que tenha relação com o porte e posse de armas, como muitos militantes políticos estão atiçando o debate.

Não sou favorável a apologia do uso de armas que prega o presidente Jair Bolsonaro, mas daí fazer insinuações maldosas tentando relacionar o mandatário do País ao uso de armas que ocasionaram o massacre da escola de Suzano ou outro evento isolado já passa do ridículo.

O documentário Tiros em Columbine, o qual retrata um massacre parecido com o ocorrido em Suzano demonstra que a liberação de armas não impede as pessoas de se protegerem em casos de violência planejada dessa natureza. Eric Harris e Dylan Klebold mataram 12 alunos e um professor, feriram outras 21 pessoas, trocaram tiros com policiais e depois cometeram suicídio.

Games, jogos, ”bullying”, famílias desajustadas, desemprego, condição social e a ausência de políticas públicas voltadas para doenças mentais são fatores que estão ligados e podem ter levado a esse massacre de Suzano, mas também serve como reflexão para que outros eventos criminosos possam ser evitados.

Lançar um olhar diferente sobre o outro é fundamental. Observar o tom de voz, o silêncio, o caminhar, a forma como encara ou evita as pessoas, o emprego das palavras. Também se faz necessário observar quando estão irritados, quando estão derrotados, abatidos, quando perdem ou quando triunfam, diz muito sobre as pessoas. A família, a escola, a religião e principalmente o poder público precisam criar instrumentos e ambientes que desenvolvam uma juventude saudável.

Nada trará de volta a vida das vítimas de Columbine e de Suzano. Portanto, fica o ensinamento, o debate da direita e da esquerda sobre a liberação ou não da posse e do porte de armas é irrelevante, diante da formação holística do ser humano.

 

 

 

 

 

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